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O submundo do crack na classe média

Nascido no submundo, o crack se espalhou também entre a classe média. No último dia da série, O POVO mostra a história de um jovem de 22 anos que viu sua vida desmoronar depois que experimentou a droga

Tiago Braga
tiagobraga@opovo.com.br
11 Nov 2009 - 00h44min

Hoje, aos 22 anos, Rafael (nome fictício) está se preparando para ser monitor do Instituto Volta a Vida, uma das comunidades terapêuticas para tratamento de usuários de drogas em Fortaleza. Longe do vício há oito meses, agora ele vai ajudar outros jovens que também tiveram suas vidas destruídas pelo crack.

A história de Rafael parece roteiro de filme, mas é vida real. Para sustentar o vício, furtou objetos de casa, se envolveu com quadrilha de clonagem de cartões, virou traficante, se prostituiu. ``Nem eu tava me suportando. Tava com nojo de mim mesmo``. A seguir, os principais trechos da entrevista feita na última sexta-feira.

O início
Meu contato com as drogas foi a partir dos 12 anos. Me sentia livre pra fazer o que quisesse, uma liberdade além do que eu poderia ter na minha infância. Sempre fui muito curioso, danado. Comecei a fumar cigarro, conhecer o mundo, bebida alcoólica, mulheres. E isso foi progressivo, tudo foi aumentando. Um ano depois, tive o primeiro contato com a maconha.

O crack
Na época, o crack não era tão popular assim, era mais pra mendigo, pessoal de baixa renda. Só que comecei a ver que muitas pessoas usavam e comecei a perder o medo. Um dia fui pra favela buscar maconha, mas tava faltando e o cara chegou e ofereceu o crack. Já sabia como usava e resolvi provar.

Efeitos no organismo
Quando conheci o crack, posso dizer que foi amor à primeira vista. Me tirava completamente da realidade, meu pensamento saía de mim. Era um prazer intenso, euforia muito forte. O efeito é muito rápido. E tem a famosa fissura do crack. É incontrolável.

Furtos
Comecei a vender as coisas dentro de casa. Minhas roupas, da minha irmã, da minha mãe, coisas do meu pai. Teve uma vez que peguei uma quantidade absurda de joias da esposa do meu pai. Também fazia furtos na rua. Com 16 anos, eu já tava fazendo furto de som de carro, com uma gangue. Minha família vive bem, é tranquila financeiramente, mas eu cheguei a esse ponto. Não tinha coragem de assaltar a mão armada, mas fazia furto. Teve uma época que também me envolvi com clonagem de cartões de crédito.

Tráfico
Por algum tempo virei traficante para sustentar meu vício. Comecei a vender crack, maconha. Eu comprava uma quantidade grande - um pouco mais barato - e vendia para outras pessoas com uma margem de lucro. Mas nunca consegui dar continuidade porque minha compulsão (por droga) era muito mais forte do que qualquer outra coisa e eu acabava consumindo o que era pra vender. Tinha vez que nem pagava o traficante, ficava fugindo. Deus me ajudou muito nessa parte, de eu não ter morrido. Porque me ameaçavam de morte. Eu já vi várias pessoas morrerem por estarem devendo muito menos do que eu devia.

Prostituição
O uso (de crack) continuou forte. Chegou ao ponto de eu me prostituir homossexualmente pra conseguir dinheiro. Não tenho dificuldade de falar disso. Sou muito seguro da minha opção sexual, mas para conseguir droga cheguei a esse ponto. Me prostituir com homossexuais que eram ricos. Eles me levavam pras festas, davam droga, dinheiro, em troca eu transava. Nem eu tava me suportando. Tava com nojo de mim mesmo.

Internação
Um dia, minha irmã de 14 anos bateu na porta do meu quarto, chorando. Ficou me questionando: "Nossa mãe tem feito tudo por ti a vida toda e você nesse estado. O que você está fazendo da sua vida?" Aquilo me tocou profundamente. Passaram duas coisas na minha cabeça: "Vou tentar me matar. Se eu não conseguir, vou dar um jeito de não usar mais droga". Ou ia morrer ou ia me internar. Usei uma quantidade enorme de crack pra me matar, mas não morri. Pensei: "Deus não quer que eu morra." Procurei a internação.

Tratamento
Fiz o tratamento de uma forma que nunca tinha feito na minha vida. Já tinha tentado mudar de religião, de cidade, de namorada, de emprego, vários tipos de tratamento e nunca funcionou. Aqui (no Instituto Volta a Vida) foi diferente. Conclui meu tratamento e hoje faço parte da equipe, treinando pra ser monitor.


EMAIS

- Na semana passada, o Ministério da Saúde anunciou um pacote de medidas para o tratamento de dependentes químicos e pessoas que sofrem de transtornos mentais. Será aumentado em até 31,85% o valor das diárias pagas por paciente internado em hospitais psiquiátricos e gerais. Também vão ser criados 73 novos Centros de Atenção Psicossocial (Caps). No Ceará, serão quatro novos centros, sendo três voltados para o atendimento a usuários de álcool e outras drogas: um em Barbalha, um em Camocim e o outro em Quixeramobim.

- Segundo o diretor do Hospital de Saúde Mental de Messejana (HSMM), Marcelo Theophilo, a Unidade de Desintoxicação (UD) do hospital, que conta com 20 leitos para homens, será reformada. Além disso, serão criados 20 novos leitos & para mulheres & e um ambulatório para o acompanhamento dos pacientes. As obras devem começar no próximo ano. ``O DER (Departamento de Edificações e Rodovias) está avaliando o projeto``, diz.

- O crack foi criado nos Estados Unidos e chegou ao Brasil no fim dos anos 80. A pedra estala em contato com o fogo, daí o nome crack.

- Segundo o diretor do Instituto Volta a Vida, Osmar Diógenes, muitos traficantes usaram uma estratégia para difundir o consumo de crack. "O usuário procurava pela maconha e eles diziam que não tinha, empurrando o crack", diz.

- A droga vicia muito rápido e causa efeitos como dilatação das pupilas, suor intenso, tremores e excitação, aceleração dos batimentos cardíacos e aumento da pressão arterial.


ONDE PROCURAR AJUDA

CAPS AD

> Regional I: rua Hildebrando de Melo, 1110, Barra do Ceará. Telefone: 3101 2592
> Regional II : rua Manoel Firmino Sampaio, 311, Cocó. Telefone: 3105 1625
>Regional III : rua Frei Marcelino, 1191, Rodolfo Teófilo. Telefone: 3105 3420
> Regional IV : rua Betel, s/n, Itaperi. Telefone: 3105 2006
> Regional V : rua Vigésimo Sexto Batalhão, 292, Maraponga. Telefone: 3105 1023
>Regional VI : rua Ministro Abnes de Vasconcelos,1500, Seis Bocas. Telefone: 3105 2966.

CLÍNICAS PARTICULARES
> Vila Serena. Telefone: 3274 8510
> Villa Vita. Telefone: 3274 5946.

COMUNIDADES TERAPÊUTICAS
> Casa de Recuperação Caverna de Adulão. Telefone: 3228 2065.
> Centro de Recuperação Leão de Judá. Telefone: 3086 0094.
> Casa Renata Couras (Shalom). Telefone: 3101 4608.
> Desafio Jovem. Telefone: 3052 7200.
> Fazenda Esperança. Telefones: 3232 9265 ou 3345 1973.
> Instituto Volta a Vida. Telefones: 3476 1988 ou 3476 2192.

HOSPITAIS PSIQUIÁTRICOS
> Hospital de Saúde Mental de Messejana. Rua Vicente Nobre Macêdo, s/n, Messejana. Telefone: 3101 4348.
> Instituto de Psiquiatria do Ceará (IPC). Avenida Bezerra Menezes, 1351, Parquelândia. Telefone: 3281 9735.

SAIBA MAIS
> Muitos dependentes químicos também procuram ajuda nos grupos de Narcóticos Anônimos (NA). Há pelo menos 44 em Fortaleza. O único requisito para ser membro é o desejo de parar de usar a droga. O anonimato é preservado.
> O NA é uma sociedade sem fins lucrativos que segue os mesmos passos do grupo de Alcoólicos Anônimos (AA). Não é cobrada matrícula nem taxas. Mais informações pelo telefone 9115 4664 ou no site www.na.org.br .

Fonte: Jornal O Povo - http://opovo.uol.com.br/opovo/fortaleza/927370.html

 

 

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